A internet que você conhece não será mais a mesma. Ao menos se a PL 2630/2020 for aprovada na Câmara dos Deputados. Já aprovado pelo Senado, o projeto, popularmente conhecido como “Lei das Fake News”, ao contrário do que o nome diz, não se restringe à combater a desinformação e à criminalização de notícias falsas - e todos nós temos a perder com isso. De autoria do Senador Alessandro Vieira (Cidadania), a "Lei das Fake News" propõe a instituição da "Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet". Isto é, pretende restringir a atuação em plataformas digitais como Facebook, Twitter, WhastApp e Telegram, impactando a vida de todos para combater um mal feito por poucos, como um tiro de canhão para matar uma barata.
Entre os mais polêmicos trechos da PL 2630/2020 estão a "proibição dos disparos em massa", tão comuns às grandes campanhas digitais feitas pelas marcas e tão bem aceita pelo grande público. Em outro controverso item, como o da remuneração de veículos jornalísticos que publicam nas redes sociais, afeta, profundamente, o jornalismo independente, enquanto privilegia as grandes corporações de notícias. Já em relação aos usuários, o item de registros para investigações põe em risco a sua privacidade. Isto porque a Justiça pode determinar que provedores de serviços de mensagem guardem e disponibilizem - em caso de investigação - os registros de textos e áudios feitos nos últimos 15 dias, podendo ser renovado até 60 dias.
Considerando que o projeto abala a ideia de uma internet livre, democrática e aberta, as empresas de tecnologia Facebook, Instagram, Google, Twitter e Mercado Livre lançaram uma carta conjunta. Nela, explicam que "se transformado em lei, o texto que está para ser votado na Câmara dos Deputados irá restringir o acesso das pessoas a fontes diversas e plurais de informação; desestimular as plataformas a tomar medidas para manter um ambiente saudável online; e causar um impacto negativo em milhões de pequenos e médios negócios que buscam se conectar com seus consumidores por meio de anúncios e serviços digitais.
CONFIRA, NA ÍNTEGRA, A CARTA DAS EMPRESAS DE TECNOLOGIA:
PL 2630/2020 deixou de ser sobre combater as fake news
Ninguém quer que notícias falsas se espalhem nas redes. Como plataformas de tecnologia, investimos continuamente em recursos e ações concretas e transparentes para combater a desinformação e estamos comprometidas a debater com a sociedade como podemos enfrentar esse desafio juntos.
Reconhecemos os esforços do Congresso Nacional na formulação de uma proposta de lei que ofereça à sociedade meios eficientes de lidar com o problema, mas, da forma como está hoje, o Projeto de Lei 2630/2020 trata pouco do combate à desinformação. Na verdade, o texto, que ficou conhecido como PL das Fake News, passou a representar uma potencial ameaça para a Internet livre, democrática e aberta que conhecemos hoje e que transforma a vida dos brasileiros todos os dias.
Se transformado em lei, o texto que está para ser votado na Câmara dos Deputados irá restringir o acesso das pessoas a fontes diversas e plurais de informação; desestimular as plataformas a tomar medidas para manter um ambiente saudável online; e causar um impacto negativo em milhões de pequenos e médios negócios que buscam se conectar com seus consumidores por meio de anúncios e serviços digitais.
O projeto determina, de modo genérico, que as plataformas remunerem os veículos de imprensa que publicam notícias nas redes. Como está, a proposta deixa em aberto como isso funcionaria na prática – por exemplo, quais os critérios para definir o que são veículos de imprensa elegíveis a receber pelas notícias publicadas nas plataformas. O PL também não reconhece esforços de parcerias que as plataformas estabeleceram ao longo dos anos com veículos de imprensa no Brasil. Isso pode acabar favorecendo apenas os grandes e tradicionais veículos de mídia, prejudicando o jornalismo local e independente, e limitando o acesso das pessoas a fontes diversificadas de informação. Associações de jornalismo e profissionais da imprensa assinaram um manifesto em 2021 chamando atenção para os efeitos negativos e pedindo a remoção do artigo do texto do projeto, o que até agora não ocorreu.
A moderação de conteúdo on-line é uma tarefa que exige que as plataformas tomem medidas rápidas diante de novas ameaças. Por isso, precisamos de flexibilidade para poder agir para remover conteúdo nocivo. O texto, no entanto, traz exigências severas caso as plataformas tomem alguma medida que seja posteriormente questionada e revertida. O receio de uma enxurrada de processos judiciais levará as plataformas a agir menos na moderação de conteúdo, deixando o ambiente on-line mais desprotegido do discurso de ódio e da desinformação. Isso vai totalmente na contramão das demandas da sociedade pela preservação de um debate público saudável, confiável e em igualdade de condições.
Para completar, milhões de pequenos e médios negócios, como a padaria ou a pizzaria de bairro, não poderão mais anunciar seus produtos com eficiência e a custo baixo na Internet. Um dos artigos do texto impede o uso responsável e equilibrado de dados pessoais – em conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), promulgada após amplo debate pela sociedade – para a entrega eficiente de anúncios e serviços que são cruciais para micro e pequenas empresas e para toda a economia brasileira. Por fim, ao estabelecer regras que se aplicariam apenas às plataformas digitais, o PL 2630 acaba com a democratização da publicidade que foi possível graças à Internet e privilegia alguns grupos de mídia.
O debate sobre as potenciais consequências negativas do PL 2630/2020 é importante e desafiador. Por isso, pedimos que essas preocupações sejam levadas em consideração antes da votação. Como temos feito desde que o PL foi apresentado em 2020, continuaremos trabalhando próximos dos parlamentares brasileiros em prol de uma proposta que beneficie a economia brasileira, a internet livre e aberta e, acima de tudo, todos que usam os meios digitais para empreender, se expressar, se informar e consumir.